Fazer o que ama é importante ao empreender, mas só isso não basta
Luiz acompanhava desde cedo sua
mãe na cozinha. Quando voltava da escola, cursava o antigo primário pela manhã,
sua mãe estava dando os últimos retoques no almoço que iria servir dali alguns
minutos. Ele subia numa cadeira e via sua mãe mexer nas panelas. Ele continuou
os estudos e acabou se formando em Direito.
Alguns anos depois de formado e com carreira promissora em um grande
escritório de advocacia, ele sentia que, mesmo bem-sucedido, faltava algo na
sua vida. Como acabara de perder seu pai, percebeu que a vida era curta. Seu passatempo
favorito era visitar o Mercado Municipal, a seção de gastronomia nas livrarias
e de cozinhar para a família aos finais de semana. Com espírito independente,
resolveu trocar o trabalho no escritório por empreender e se dedicar àquilo que
sempre amou - a culinária. Pediu demissão do escritório e abriu um bistrô.
A atividade que adotamos como nosso passatempo, aquela que desfrutamos por
prazer, pode sim ser a porta de entrada para o mundo dos negócios. Afinal, um
dos fatores mais importantes para o sucesso de um empreendedor é fazer aquilo
que gosta - ter amor ajuda muito, até porque é inevitável que muitos obstáculos
apareçam pela frente e somente com muita determinação e persistência é possível
continuar na luta. Também porque é necessário conhecer o negócio em que se deseja
atuar e, geralmente, quando gostamos de algo estamos atentos, envolvidos ou até
somos grandes conhecedores do assunto. Assim, é um bom começo nos identificar com
o futuro negócio.
Luiz, que amava cozinhar, procurou um ponto comercial, contratou
arquiteto, engenheiro, fez reforma, comprou móveis, montou cozinha, abriu a
empresa, criou uma marca com nome e logotipo, desenvolveu o cardápio, contratou
funcionários. Na inauguração, chamou seus parentes e amigos. Estava realizado,
muito feliz. No dia a dia, realizava as compras cedo de manhã, controlava o
caixa, as contas a pagar, fazia banco e verificava questões contábeis e de
tributos. Ele virou administrador, financeiro, gestor de RH e teve que
contratar um chef, com quem no começo chegou até a discutir ingredientes e o
cardápio, mas breve deixou de fazê-lo.
Com o tempo, percebeu que já não ia ao Mercado Municipal, nem namorava
livros de culinária, nem tinha tempo para realizar as viagens que tanto gostava
e que havia deixado de cozinhar por prazer. Ele havia montado aquilo que achava
ser o negócio da sua vida, mas teve que parar para repensar seu papel.
Há inúmeros casos onde começamos o negócio levando em consideração
nossas paixões, mas, com o tempo, pode ocorrer de nos distanciarmos da
atividade específica que gostamos para virarmos gestores. É importante saber que
isto pode ocorrer, para não gerar frustrações. Não devemos perder de vista que
ser o responsável principal pelo negócio pode forçá-lo a se dedicar a
atividades outras que não somente aquelas sonhadas.
Há formas de se evitar estes problemas, como ter entendimento claro da
equipe necessária, entender a sua posição dentro desta, saber montar a equipe e
até recorrer à terceirização para os serviços em que não deseja se envolver.
Mas não se deve esquecer que a responsabilidade final será sempre do empreendedor.
Negócios e Ambiente de Negócios é um assunto complexo e com muitas
variáveis. Tenho como meta aqui avançar uma a uma, passo a passo, de forma
calma e contínua, tal que eu possa apresentar, explicar, analisar e discutir com
vocês cada passo que vamos dar daqui para frente. Hoje vimos aspirações do
empreendedor, sua identidade com o negócio e cotidiano. No próximo texto vamos
conversar sobre racional econômico.
Sobre o Autor
Alberto Ajzental é Engenheiro Civil pela POLI-USP. Mestre e Doutor pela EAESP-FGV. Foi e é Professor de Estratégia de Negócios, Marketing e de Economia nas escolas ESPM-SP e EESP-FGV. Autor dos livros A Construção de Plano de Negócios - Ed. Saraiva, História do Pensamento em Marketing - Ed. Saraiva e Complexidade Aplicada à Economia - Ed. FGV.